quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Nossa FÉ não está à venda!




Emiliano Tardif era um sacerdote canadense que vivia como missionário na Republica Dominicana. Ele não nutria grandes simpatias pela Renovação Carismática, mas um dia, acometido por uma grave doença, foi curado pelo Senhor de forma extraordinária, após receber oração de um grupo de pessoas do Movimento. Além de ser curado, esse servo de Deus recebeu o carisma da cura, e impulsionado pelo ardor missionário, percorreu o mundo exercendo seu ministério.

Por meio dele, milhares de pessoas experimentaram o operar de Deus de forma extraordinária, com prodígios, milagres, e sinais. Quando questionado se não havia um exagero na ênfase da cura em sua pregação, o sacerdote respondia que gostava de fazer aquilo que era tão precioso para Jesus Cristo. “Não sou eu quem faz isso. Por que alguns menosprezam o que para Jesus tinha grande significado?”, questionou, em certa ocasião, referindo-se à grande quantidade de curas realizadas pelo Senhor.

Para ele estava claro que o exercício de qualquer carisma é um serviço à comunidade e, portanto, é Amor (Dom Maior). Estava convencido de que a Renovação Carismática é uma força evangelizadora, porque ensina seus membros a abrirem-se ao poder do Espirito Santo, a Seus dons e carismas. Grande defensor dos carismas, Tardif reconhecia, no entanto, que eles poderiam ser desvirtuados. Como? Quando exercidos fora do contexto. “Os sinais portentosos acompanham o anúncio do Evangelho. Não acontecem isolados, mas quando proclamamos a salvação em Jesus Cristo”, explicou.

Ele também lembrou que Jesus disse que, após ouvirem o anúncio, as pessoas deveriam ser batizadas em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo (Mt 28, 18-19). Ou seja, a cura deve ser seguida pela vida sacramental. “Trata-se, porém, de uma corrente de três elos: Palavra – Cura – Sacramento. Se não for assim, se desvirtua”. Padre Tardif também contava que aprendeu, no decorrer de seu ministério, a não orar pelos enfermos se não pudesse proclamar a vitória de Jesus na cruz e o triunfo de sua ressurreição.

E porque estamos refletindo sobre isso? Porque precisamos identificar esses e outros desvirtuamentos da fé, estar atentos ao que ocorre ao nosso redor e sermos guardiães de uma evangelização autêntica, principalmente em nossos dias em que sérios riscos rondam o cristianismo ou já estão bem infiltrados em nosso meio. Muitos estudiosos dizem que uma das características que marcam a sociedade atual é o consumismo intenso, em que tudo se transforma em mercadoria, inclusive a religião. “A busca da religião se realiza por necessidade de cura, conquistar o amor de alguém, prosperidade nos negócios, aumento da riqueza, segurança, busca do laço amoroso que se rompeu, sentimento  de utilidade, gosto de viver sem angustia, realização pessoal e por tantas outras necessidades que poderão ser criadas. A religião entra como mercadoria e deve seguir as normas do mercado”.

As religiões se tornaram serviços espirituais em oferta no “supermercado religioso” do mundo moderno. O fiel, na sua liberdade de consumidor, pode escolher e dispor de tudo. A religião se transforma em mercadoria e o cliente tem sempre razão. “Elas são oferecidas, opcionalmente, sem obrigação e com desconto como religião “light”, igual às ofertas em prateleiras de literatura esotérica numa livraria. Tudo é possível, nada é levado a sério”.
Mal que vem sendo amplamente propagado, incentivado, podemos dizer, sobretudo, pela chamada Teologia da Prosperidade ou da Retribuição, segundo a qual “Deus fica na obrigação de cumprir todas as promessas contidas na Bíblia na vida do fiel. Deus torna-se prisioneiro e refém de sua própria Palavra. Dessa maneira, o fiel passa a viver de acordo com o ‘Evangelho de suas predileções’.” Este mercado religioso se apresenta promissor e lucrativo. Tanto que tem sido cada vez mais comum encontrarmos pessoas ou grupos não cristãos por trás de atividades relacionadas à evangelização.

Obviamente não podemos impedir que as pessoas recorram à Igreja apenas por essas razões ou quaisquer outras. Devemos acolher a todas, inclusive sem julgá-las. Se nos debruçamos sobre o assunto é porque não podemos ignorar tal fenômeno. Além disso, precisamos estar atentos para não reforçar ou até mesmo estimular essa tendência.
Devemos ser sempre fieis à verdadeira proposta do Evangelho, sem cairmos na tentação de oferecer uma religiosidade apenas para solucionar problemas terrenos ou baseada em critérios subordinados a valores impostos por uma sociedade consumista, ou que já não queira viver os valores do Evangelho.

Devemos estar atentos, porque lamentavelmente os problemas não existem apenas em seitas, como muitos poderiam supor. Estão presentes dentro da Igreja. Bento XVI, quando Prefeito da Sagrada Congregação para a Doutrina da Fé, alertou sobre o risco de em nossas atividades pastorais excluirmos partes do Evangelho. “Alguns catecismos e muitos catequistas não ensinam mais a fé católica no seu conjunto harmônico, onde toda verdade pressupõe e explica a outra, mais procuram tornar humanamente ‘interessantes’ – segundo a orientação  cultural do momento – certos elementos do patrimônio cristão. Alguns textos bíblicos são selecionados porque considerados ‘mais próximos da sensibilidade contemporânea’; outros, pelo motivo oposto, são deixados de lado.”

Em muitos livros, entrevistas, mensagens, ele tem chamado a atenção para o fato de que o Evangelho não precisa ser “enfeitado”. Ele não extrai o valor de sua popularidade. Nesse sentido, há o risco de até mesmo Jesus ser apresentado de forma deturpada. “Hoje em dia, afirmou-se amplamente, até entre os crentes, a imagem de um Jesus que nada exige, que nunca reprova, que acolhe tudo e todos, que nos aproa em cada coisa.” A Igreja não precisa disso. Quem atentar para essas exortações de nosso Papa não cairá nessas tentações que rondam a fé cristã. Como vimos, a religiosidade de mercado geralmente destaca a imagem de Deus como um solucionador de problemas. Vemos isso tanto em pregações como em músicas. A ordem se inverte: é Deus quem está a serviço do homem. Todas as mensagens bíblicas são adaptadas para corresponderem a essa premissa.

No mercado da fé, servos são considerados ídolos, estrelas; fiéis viram fãs, tietes; assembleia viram plateias; povo, público consumidor. Eventos religiosos se transformam em espetáculos grandiosos. Unção é substituída pela emoção, produzida por efeitos visuais e sonoros. Neste mercado não convém se falar sobre a cruz, morte de Jesus pela redenção dos pecados. Aliás, pecado é uma palavra quase proibida. Redenção, Ressurreição, Céu, Vida Eterna: assuntos pouco comentados. Não convém, porque se esses temas vierem à tona, o mercado estará ameaçado. As pessoas vão se dar conta de que esse mundo passa, com suas vaidades. Esse cenário está tão distante dos cristãos das origens sobre os quais se podia dizer: “Estão na carne, mais não vivem na carne; moram na terra, mais tem sua cidadania no céu; obedecem as leis estabelecidas, mas com sua vida ultrapassam as leis.”
É claro que é bom desejar que o Senhor intervenha em nossa vida. Ninguém cuja fé seja autêntica deveria rejeitar essa necessidade, porque estaria cometendo um erro talvez pior ainda. Mas isso deve ser fruto de um relacionamento sincero com Ele. Não um incentivo para que as pessoas O busquem sob demanda.

Esse tipo de “evangelização” não dá frutos. Até vemos algo sendo construído. O problema é que essa construção se dá sobre um terreno movediço, como a areia. No primeiro vento forte, se o problema não for resolvido, tudo se desmorona. Os “clientes da fé” sentem-se lesados. Esse tipo de “evangelização” não levará ninguém almejar a santidade. A amar o Senhor com toda a sua alma, coração, entendimento. A amar o próximo. A dar testemunho de vida.
É preciso que façamos o contrário. Que em nossos Grupos Ele seja cada vez mais exaltado como Senhor. Que Ele seja louvado como convém. Que ensinemos o Evangelho em sua integralidade. Que todos saibam que a verdadeira benção é contemplar a face do Senhor. Ele nos agracia com presentes o tempo todo, com o sopro de vida. Ele é nosso Deus e merece o nosso Amor. Mesmo que nunca mais nos desse nada, Ele já nos deu tudo. Deu-nos a salvação por meio de seu Filho Jesus Cristo. Deu-nos acesso direto a Ele.

Devemos ensinar que todos devem se aproximar de Deus com as mãos limpas e o coração puro. Porque são os puros que O verão (Mt 5,8). Que saibamos servi-lo com humildade, conscientes de nossa condição e de que toda glória pertence somente a Ele. É preciso que contemos a todos que Jesus prometeu que voltaria. A sonhar de novo com o seu retorno como nossos pais na fé faziam. É preciso pedir que Ele volte. É preciso sonhar com o rosto do Senhor. Desejar o céu como a meta mais elevada de nossa vida. Isso não está à venda. Isso é Graça. Isso é Salvação!

Por Lúcia Volcan Zolin
Coordenadora Nacional do Ministério e da Comissão de Comunicação

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